sexta-feira, 29 de julho de 2011

Vê se entende meu grito de alerta...






Veio de pronto em minha cabeça agora essa música. Lembrança de Mainha... "Meu! filho!, as! palavras! têm! força!"... dizia com uma calma de condenação e com os "ssss" rechicoteando sinuosamente na boca!!! Nunca tive dúvida depois disso da carne de cada vocábulo. Lá em casa nunca se xingava ninguém pelo reconhecimento do poder da palavra... No dia que eu disse que Fulaninho era maluco, ela me corrigiu dizendo: "você quer mesmo isso para ele?"! Carreguei até outro dia o medo de que eu fosse responsável acaso um dia ele perdesse a razão...

Ai, Nome da Pelada?... jamais! Ainda hoje, quando escuto, vejo olhos aguerridos dizendo-me: "aí não!"... e hoje vejo corriqueiramente os meninos dando o tal nome da pelada sem a menor burocracia com que éramos patrulhados a não dar... Falta de respeito com aquela de quem não se pode dizer o nome... Ave Maria!

Tenho certeza plena que a gente adormeceu a língua e não entende quando uma palavra ferve na boca, cura dor de dente e desobstrui uma artéria: "vá tomar no cu!", pronto! disse! Vá-tomar-no-cu ficou tão chato... em tempos de cirurgia bariátrica, perdemos mesmo foi a medida. Nostálgico, lembro que para ir na casa de titia Alice ou de titia Catita, a gente tinha de se ajeitar e pedir bença e saía de lá todo reluzente... amava ir na rezadeira comer bolacha de goma enquanto ela proferia palavras de quioiô, ininteligíveis e poderosas! Outro dia, foi que eu parei para pensar porque para entrar na casa de Dona Lindaura tinha de pedir uma licença diferente e escutar dela, de uma criança, um sorriso mágico e convidativo!!! Licença, gente... que peso!

Recuperei essas memórias depois de ouvir Lágrimas com Bethânia que tem uma dose precisa da explosão de cada palavra. Não falo da voz dela, mas de como ela usa o poder de que Mainha sempre me falou... o segredo de cada palavra dita num encaixe de tempo, sabor e desejo: his-tó-ria! Quero saber respeitar cada palavra, alcançá-la à tez, no gesto de cada curva tocante de língua, lábio, dente e ar... devorar um "amor" como que consumindo meu corpo. No dia em que eu descobrir a alquimia presente em "cada verso triste que a dor me ensinar", a dor só será mais um sabor... sem intoxicar!

Vou indo à procura da alerta de cada grito de um verbum ainda que imerso no mais rubro silêncio... [brega, menino...]

5 comentários:

  1. Ari,

    Fui lendo e tendo lembranças, que não necessariamente têm a ver com o assunto do texto, mas já que as lembranças vieram...
    Nunca, nem de brincadeira, chutei ou empurrei alguém cm o pé, pois minha mãe me dizia, convicta, que quem bate com o pé vai para o inferno.
    Lembrei tb de qdo me levavam para 'rezar' na casa de uma senhora. Normalmente quando eu estava doente...Eu não tinha noção de nada, mas achava td muito legal.
    Bom lembrar

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  2. Lindo texto. Sou deste tempo também, e sinto saudade!

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  3. Gente, hoje de manhã foi que eu entendi porque Bethânia é tão importante para mim... é que ouço Mainha em cada palavra... Vlw, meninas!!!!

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  4. O xingamento para mim é uma catarse, e transgressão também, por causa do alertas apocalípticos das minhas catequistas e da minha mãe, mas, foi uma delícia ler seu texto, como sempre foi uma delícia ouvi-lo!
    Seu texto já me deu uma saudade estranha dessas burocracias maternas das quais ainda nem me emancipei... Obrigada.

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  5. Ari, vários momentos me vieram a mente com essa leitura. Também so do tempo que não se podia dizer o nome da pelada!
    Bons tempos! Que "lá ela"!

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